Imagine a seguinte situação: você está com todas as suas contas de luz pagas em dia e nunca teve o nome inserido em nenhum cadastro restritivo de crédito em toda a sua vida. De repente, um certo dia, você se dá conta que a energia elétrica do seu imóvel foi cortada sem aviso prévio e seu nome foi inserido no SERASA também sem nenhuma comunicação. E o pior, você nem faz ideia do motivo.
Este caso aconteceu com o consumidor Raphael Carvalho, proprietário de um pequeno apartamento em Campo Grande, na Zona Oeste. Raphael narra que no dia 24/06/2021 se deu conta que sua energia elétrica havia sido suspensa pela Light Serviços de Eletricidade S.A., concessionária que atua na Região Metropolitana e diversas cidades do Estado do Rio.
Após constatar o corte, o consumidor imediatamente foi na Internet e entrou na Agência Virtual da Light para verificar se havia alguma conta em atraso e viu que não havia nenhuma conta vencida, mas, ao clicar na opção “Religação Após Corte” para solicitar a religação da energia, verificou que de fato o fornecimento estava suspenso e havia informação de três faturas “misteriosas” de R$ 70,38 (mas sem opção de baixá-las) que o mesmo não fazia a menor ideia do que se tratava. Então, ligou para a Light (protocolo nº 2184619003), que lhe informou que sua luz tinha sido cortada por conta de duas parcelas em atraso de um TOI (Termo de Ocorrência de Inspeção) no valor de R$ 1.267,00 (mil, duzentos e sessenta e sete reais), dividido em 18 parcelas, e que havia sido feito em 08/12/2020, portanto, quase seis meses antes. O problema é que Raphael nunca soube de tal inspeção, já que nunca foi comunicado nem antes, nem durante e nem depois do procedimento, realizado de forma unilateral pela Light. Raphael afirma, ainda, que as parcelas não foram entregues pelos Correios e também os arquivos PDFs nunca estiveram disponíveis nem mesmo no sistema online da concessionária, de forma que sua existência nunca foi conhecida e seu pagamento impossibilitado. Foi necessário, ao telefone, solicitar que as faturas do TOI fossem enviadas por e-mail, recebido no mesmo dia 24/06/2021, às 23:03 da noite, para poder realizar o pagamento e ter sua energia reestabelecida, já que pelo sistema da Agência Virtual não havia opção de download das cobranças do TOI.
Logo no dia seguinte, 25/06/2021, o pagamento das três primeiras parcelas do TOI foi efetuado, totalizando R$ 211,14, e o pedido de religação feito logo em seguida na própria Agência da Light em Campo Grande, tendo a energia reestabelecida no mesmo dia 25/06/2021 por meio de uma Religação Técnica.
Mas para piorar ainda mais a situação, ao entrar no site do SERASA (no mesmo dia em que sua energia foi cortada), através do sistema Serasa Experian, Raphael verificou que seu nome estava negativado pela primeira vez na sua vida, por conta de “duas dívidas” com a empresa Light, de números 500020969626 e 500021372939, que correspondem exatamente aos números das faturas da 1ª e 2ª parcelas do TOI, demonstrando que seu nome foi de fato negativado por conta do não pagamento de um TOI que o consumidor nem sabia da existência. O nome só foi retirado do SERASA cerca de dois meses depois do pagamento das primeiras parcelas do TOI.
Ação de Danos Morais conta a Light
Consternado, o consumidor foi buscar seu direito à reparação mediante todos os transtornos causados pela empresa, e ingressou com uma Ação de Indenização por Danos Morais contra a Light através do Processo nº 0025422-07.2021.8.19.0205. Mas, para sua surpresa e indignação, a Juíza da 7ª Vara Cível de Campo Grande, Dr.ª Ana Paula Azevedo Gomes, em sentença proferida em 23/05/2022, até cancelou o TOI reconhecendo a arbitrariedade da inspeção por parte da Light e que não houve violação do medidor, mas negou o Dano Moral afirmando que o Autor “não teve a energia suspensa e nem o nome negativado”.
“– É muito frustrante! A gente trabalha pra caramba pra pagar nossas contas em dia, sem atrasar, e tem a energia cortada sem nem saber o motivo. E a Light ainda colocou meu nome no SERASA pela primeira vez na minha vida sem nem me avisar. Uma empresa milionária que trata o consumidor com total negligência e descaso. Tive que pagar R$ 1.200 para entrar com a Ação de Danos Morais, e meu Advogado disse que para recorrer em 2ª Instância precisarei desembolsar mais R$ 900. Totalmente injusto e desanimador!”, lamenta Raphael.
O consumidor ainda completa: “Com todo respeito ao Judiciário, sei que eles também trabalham à beça e estão sobrecarregados, mas no processo tem todos os documentos que comprovam o corte e a negativação, inclusive fornecidos pela própria Light. Sinceramente, a impressão que eu tenho é que parece que eles nem leram nossa petição direito, igual aquele caso da ‘Receita de Pamonha’, lembra?”, fazendo menção a um famoso caso divulgado no conceituado site jurídico “JusBrasil”, onde um advogado teria escrito em uma petição, em área reservada à citação jurisprudencial, uma “receita de pamonha”, na tentativa de provar sua suposta tese de que alguns juízes não leem as petições com a devida atenção.
O setor jurídico do Portal Fluminense teve acesso à demanda e analisou o processo do consumidor Raphael Carvalho contra a Light, identificando que realmente foram acostados aos autos documentos que comprovariam não somente o corte de energia (fls. 57, 68, 69, 70 e 160) como também a negativação do nome do consumidor junto ao SERASA (fls. 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138 e 139), o que parece demonstrar possível omissão por parte da referida vara judiciária na análise processual.
Entramos em contato com o Cartório e com o Gabinete da 7ª Vara Cível da Regional de Campo Grande, solicitando um posicionamento da Vara acerca da referida sentença e quais as razões que teriam levado a Magistrada a desconsiderar tais documentos. O Cartório nos encaminhou para a Assessoria de Imprensa do TJ-RJ que, em nota, informou que “cabe à parte, que pretende a reavaliação da prova, recorrer”.
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