Uma manicure perdeu a visão do olho direito num ataque de facão de um desconhecido, incomodado com o samba enredo da Grande Rio, escola campeã do carnaval carioca, que homenageou este ano o Orixá Exu. O caso foi registrado em Itaboraí, e o agressor está foragido há quase seis meses.
A vítima, Bruna Domingues Vaz, disse que bastou tocar o samba dentro de casa, para o agressor, que estava num bar do outro lado da rua, iniciar a confusão, segundo informações do site G1.
“Cheguei lá e perguntei a ele qual era o problema. A gente tava no nosso horário, o porquê da ironia de falar se a gente era macumbeiro ou pagodeiro. Ali ele se exaltou e veio para cima de mim”, contou Bruna Domingues Vaz.
“Ele já veio com facão e não queria saber aonde ia pegar e em quem ia pegar. Eu estava na calçada, foi na hora que eu passei, e o facão veio me acertar”, relembra.
Intolerância religiosa
Os casos de intolerância religiosa cresceram nos últimos anos no estado do Rio de Janeiro. As religiões de matriz africana são os principais alvos dos ataques.
Em maio deste ano, o pastor Felipe Valadão, da Igreja Batista Lagoinha, fez uma pregação pública contra as religiões de matriz africana. Ele foi denunciado pelo Ministério Público.
“Avisa para esses endemoniados de Itaboraí que o tempo da bagunça espiritual acabou. Pode matar galinha, pode fazer farofa, prepara para ver muito centro de umbanda sendo fechado na cidade.”
Patrimônio cultural do Rio de Janeiro, um altar erguido nas proximidades dos Arcos da Lapa em homenagem a Zé Pelintra, uma das entidades da umbanda, já foi alvo de 22 ataques em apenas quatro anos.
“Eles depredavam na madrugada, pichavam com mensagens de ‘vou quebrar tudo’, ‘vou dar marretada na cabeça de vocês’, ‘demônios’ e essas palavras de ordem que tendem para intolerância”, conta o produtor cultural, Diego Gomes.
“O registro da queixa começou a ser feito através de ações junto ao governo do estado e à Prefeitura do Rio com as coordenadorias de combate à intolerância religiosa da época. Por que não tem uma ação mais contundente para investigar essas ações?”, questiona.
A Comissão de Combate à Intolerância Religiosa recebeu 47 registros de intolerância no ano passado. Seguidores da umbanda e do candomblé são as principais vítimas desse gênero de violência.
Mas os responsáveis pelo estudo afirmam que na ampla maioria dos casos não há sequer registros formais nas delegacias.
“Se você não tem uma rede de proteção que encoraja as pessoas a denunciarem e consequentemente há uma impunidade, você vê que não há uma medida dos órgãos públicos tratarem como tem que tratar, como crime, obviamente você encoraja as pessoas a seguirem adiante”, diz o babalaô Ivanir dos Santos.
“Mesmo com essas dificuldades têm que ir à delegacia, levar testemunha e denunciar.”
A região com maior número de ocorrências é a capital, seguida pela Baixada Fluminense. Em quase 24% dos casos o agressor era um vizinho intolerante.
Um terreiro foi depredado há três anos em Duque de Caxias. Em um caso raro de punição, os responsáveis pelo ataque foram indiciados e respondem pelo crime.
Uma mulher que frequenta o local e preferiu não ser identificada diz que, mesmo assim, ainda sente medo.
“É um pouco absurdo a gente ter a garantia institucional de um estado laico e de liberdade religiosa e a gente não tem essa efetiva liberdade. Então, a gente está perdendo cada vez mais espaço”, afirma.